Voz e Estilo

Voz e Estilo

Um tópico que aflige muitos novos escritores é a questão da voz e estilo. Muitas dúvidas começam a aparecer: estilo é a mesma coisa que voz? Como crio esta voz? Como posso desenvolver meu estilo próprio e evitar ser mais um na multidão?

Voz e Estilo (Como escrever um Livro)

Podemos dizer que estilo remete as escolhas que o autor faz durante seu processo de criação: as palavras que ele usa (longas, curtas, simples, rebuscadas), como estas palavras são costuradas na sentença e como essas sentenças formam os parágrafos. A voz é aquilo que o seu leitor “escutará” ao ler seu livro. Aquilo que com sorte, vai permanecer com ele mesmo depois de terminar o livro.

Voz do autor

O estilo pessoal de um autor contar suas estórias, que pode variar de livro a livro ou ser o mesmo em todas suas obras.

Voz do Personagem/Narrador

A voz (que pode ser primeira, segunda ou terceira pessoa) de um personagem/narrador, e como ele escolhe nos contar a estória.

Como Começar

Uma das melhores coisas a fazer quando começamos a escrever é decidir quem vai ser o narrador do livro e a partir daí, focar na voz deste narrador. Se você estiver narrando um livro em primeira pessoa, a voz deve corresponder a personalidade do personagem em questão. Você não pode ter um médico que esta narrando sua experiência trabalhando nos primeiros soccorros e ele soar como um comerciante.

Abaixo listo algumas opções de vozes que podem ajudar a achar qual mais se encaixa no seu caso. Vale lembrar que existem mais opções do que as citadas abaixo, e nunca tenha medo de criar algo novo que satisfaça sua necessidade de contar uma estória.

Voz de Conversação

Geralmente usada em primeira pessoa, é aquela onde o narrador parece estar tendo uma conversa casual com o leitor. Um exemplo desta voz narrativa é a usada pelo personagem Holden Caulfield, o adolescente do livro O Apanhador no Campo de Centeio, de J.D. Salinger.

Voz Informal

Este narrador (frequentemente usado em primeira pessoa) não é tão coloquial quanto a voz de conversação, mas ainda teremos uma linguagem mais simples e cotidiana.

Voz Formal

A voz formal mantém uma certa distância dos personagens. Mais usada em narrações na terceira pessoa, pode funcionar na primeira, desde que o personagem tenha uma personalidade condizente. Não esperaríamos um trabalhador braçal de uma fazenda descrevendo sua realidade em termos formais.

Um exemplo da voz formal em primeira pessoa é Humbert Humbert, do livro Lolita, de Vladimir Nabokov. Este narrador, Humbert, frequentou uma boa escola e depois se tornou um estudioso de literatura, logo é natural que sua linguagem formal, por vezes rebuscada e até mesmo pedante.

Voz Cerimonial

Distante e desapegada, esta voz é raramente usada na primeira pessoa. A voz cerimonial dá uma sensação de importância a estória, mas pode parecer afetada e reprimida. Um exemplo é Oliver Twist, de Charles Dickens.

Fluxo da Consciência

James Joyce fez amplo uso deste método, onde a voz reflete os pensamentos livres e soltos que passam pela cabeça do narrador, por vezes até de maneira desordenada e confusa.

Lembre-se ainda que é importante considerar a objetividade, confiabilidade e onisciência do narrador. Nem todos os narradores sabem tudo o que se passa na estória, e nem todos estão contando a verdade.

Outros fatores importantes que não podes ser esquecidos são as palavras que o narrador usará (longas, curtas, simples, rebuscadas), a formação das sentenças e os parágrafos.

As Palavras

A escolha das palavras certas se baseia em conhecer bem seu narrador e quais palavras ele usaria para se expressar. Como falei antes, uma dona de casa usa um vocabulário bem diferente de um juiz.

As Sentenças

As sentenças podem ser construídas de maneira simples ou complicadas, usando palavras comuns ou difíceis, com muitos ou poucos verbos e adjetivos, serem longas ou curtas. O importante é não escrever TODAS suas sentenças do mesmo tamanho. Se você fizer isso o seu leitor se entediará rapidamente. Por isso, varie ocasionalmente.

Os Parágrafos

Como falei acima sobre o tamanho das sentenças, use uma variação na extensão dos seus parágrafos, evitando assim a sensação de estagnação. Quem já não virou uma página e viu 3 ou 4 longos parágrafos do mesmo tamanho e resolveu fechar o livro e continuar no dia seguinte?

Não Desista!

Voz e estilo podem parecer difíceis de definir, e mais ainda de aprender. Porém, a parte técnica é absorvida com a prática de escrita, compreensão e conhecimentos de gramática.

Mas ter algo a dizer e conseguir faze-lo com naturalidade é tão ou mais importante do que o conhecimento técnico. Não consigo lembrar de nenhum bom livro que não tenha algo de novo, fresco ou original. Algo que eu não conhecia, ou uma nova perspectiva sobre algo que todos conhecemos ou até algo que sabemos instintivamente, e que está adormecido no nosso subconsciente, mas é trazido a tona pelo escritor. Então lembre-se:

Tenha algo a dizer!

Exemplo de Estilo:

Como exemplo de estilo, quero citar o meu escritor favorito, José Saramago. Em seu estilo único você não vai achar aspas, ponto, hifens e nem mesmo travessão para as falas, Mas como assim, e quando os personagens falam, como ele pontua, Separando cada fala com uma vírgula e uma maiúscula, Ah, entendi, Parece difícil, mas não é

Saramago tem um comando total e completo da língua portuguesa, do seu ritmo e sua cadência. Seu estilo é especial, mas vale lembrar que este estilo não passaria de um aborrecimento caso ele não tivesse estórias maravilhosas para contar.

Entre outros estilos notáveis temos Dorothy Parker, que curtia uma gíria, saca? E Hemingway usava frases curtas. Frases curtas e repetições.

Exercício:

Releia seu livro favorito, e desta vez preste atenção ao narrador da estória.

  • Em qual pessoa o livro esta sendo narrado (primeira, segunda ou terceira pessoa)?
  • Qual voz esta sendo usada (conversação, informal, formal, cerimonial, fluxo de consciência ou outro)?
  • Como é o vocabulário deste narrador?
  • O vocabulário combina com quem ele parece ser?
  • Como este vocabulário esta sendo usado na construção das sentenças?
  • E os parágrafos?

Vale a pena lembrar

Não foque tanto em como vai desenvolver seu estilo e voz a ponto de sentir-se paralisado. Se existe uma estória que você deseje escrever, sente-se e comece a escrever. O importante é escrever. Quando chegar o momento de revisar e re-escrever, você poderá achar a voz do seu narrador, checar o uso das palavras que ele usou, ver se suas sentenças funcionam ou não, se os parágrafos estão cansativos, etc. Mais uma vez, o importante é escrever.

Livro consultado enquanto escrevia este post:
Publishing, Bloomsbury. Gotham Writers’ Workshop: Writing Fiction, 2003.

escrito por
Patricia